STF analisa tributação de doações e heranças no exterior - Andersen Ballão Advocacia

Artigos e Publicações

Ariel Gustavo Born Palmeira

STF analisa tributação de doações e heranças no exterior

Publicado em 03/11/2020

Autor:

Ariel Gustavo Born Palmeira |

 

 

Em vinte e três de outubro, o Supremo Tribunal Federal iniciou o
julgamento do Recurso Extraordinário 851108, o qual trata da incidência
do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) quando o
doador tem domicílio ou residência no exterior, e quando o de cujus
possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário
processado no exterior.
Nestas hipóteses, a Constituição Federal exige a existência de lei
complementar (norma diferenciada, que demanda um quórum de
aprovação mais alto no Poder Legislativo) para que o tributo possa ser
instituído, e consequentemente cobrado pelos estados. Ocorre que, mais
de vinte e cinco anos após a inclusão desta previsão na Constituição, a
lei ainda não existe em âmbito nacional.
Diante da inércia do legislativo brasileiro, vários estados editaram suas
próprias leis para cobrar o ITCMD sobre operações envolvendo o
exterior. Fundamentaram essa prática no suposto direito de legislarem de
maneira plena quando há inércia/omissão do Congresso Nacional.
Entretanto, contribuintes viram essa prática como inconstitucional, pois
esse direito de legislar supletivamente teria consequências que
excederiam os limites dos poderes tributantes, e implicaria provável
bitributação. Em outras palavras, apenas lei complementar nacional
poderia trazer normas sobre o tema, e não lei complementar estadual.
Tal impasse deu origem a diversas discussões administrativas e judiciais.
Apesar de não existir unanimidade nos julgamentos, o entendimento

majoritário dos tribunais pátrios é pela inconstitucionalidade das leis
estaduais e consequente não incidência do tributo.
Em virtude da grande relevância do tema para a arrecadação dos
estados, e da enxurrada de ações judiciais discutindo a questão, foi
reconhecida a repercussão geral do tema pelo Supremo Tribunal
Federal, a fim de uniformizar o entendimento judicial. O julgamento do
mérito, entretanto, foi iniciado apenas cinco anos depois.
O tema causa grande polêmica. Não é incomum que famílias com alto
poder aquisitivo criem estruturas legais para manutenção de seu
patrimônio no exterior. Entretanto, alguns contribuintes praticam
ilegalidades por meio delas, enviando patrimônio ao exterior, transferindo
a herdeiros, e posteriormente repatriando o capital, com o único intuito
de evitar a tributação brasileira (abuso de formas).
Do outro lado da moeda, há contribuintes que não praticaram nenhuma
ilegalidade, porém se veem obrigados a recolher um tributo instituído por
lei inconstitucional. É o caso de trabalhadores que migram
temporariamente ao Brasil, e nesse meio tempo recebem doações ou
heranças as quais, na maior parte das vezes, já são tributadas em seus
países de origem.
Em seu voto, o Ministro Dias Toffoli (relator) sugeriu tese de repercussão
geral favorável aos contribuintes, propondo que é vedado aos estados
instituir o ITCMD nas hipóteses discutidas sem a existência de lei
complementar nacional. Contudo, também foi sugerida a modulação dos
efeitos da decisão apenas aos fatos geradores ocorridos após a
publicação de acórdão.
A modulação busca evitar o grande impacto nos cofres públicos
estaduais: apenas em São Paulo, a perda seria de R$ 5 bilhões nos
próximos cinco anos. Entretanto, ela impacta negativamente todos os
contribuintes os quais já têm discussões em curso – apesar de ser
reconhecida a inconstitucionalidade das leis estaduais, o tributo ainda
seria cobrado.

Até o momento da elaboração do presente texto, o Ministro Edson
Fachin acompanhou o voto do relator, e o Ministro Alexandre de Moraes
apresentou pedido de vista.

Ariel Palmeira é advogado do Departamento Tributário da Andersen
Ballão Advocacia.

Artigos Relacionados

STJ estabelece parâmetros para definição de vínculo empregatício…

Em 22 de outubro de 2024 foi publicada uma decisão bastante relevante do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Recurso Especial n. 1.652.347/SC, sobre as…

Leia mais

Inovações no direito tributário alinhadas ao ESG: das…

* Barbara das Neves e Leticia Machado de Assis A abordagem ESG (Environmental, Social, and Governance) avalia a atuação das empresas em três áreas fundamentais:…

Leia mais

O uso frequente de Medidas Provisórias e os…

*Amauri Melo Desde 2023, o Governo Federal tem promovido alterações na legislação tributária sob o argumento do equilíbrio fiscal. Inicialmente, foram anunciados programas de autorregularização…

Leia mais